Em expansão e com perspectivas positivas para os próximos anos, o agronegócio no Rio Grande do Norte avança para novas discussões com foco em inovações diante do mercado brasileiro. Em entrevista à TRIBUNA DO NORTE, Geraldo Melo Filho, diretor-geral do Instituto Pensar Agropecuária (IPA), explica que o cenário do setor é reforçado com características naturais avançadas, mas que ainda é necessário expandir a capacitação dos produtores na implantação de tecnologias adequadas. Ele ainda opina sobre os melhoramentos genéticos no âmbito nacional e os impactos econômicos no setor. Acompanhe:
Como você avalia o potencial do agronegócio no Rio Grande do Norte?
Cada região do Brasil tem suas principais características e suas forças específicas. No caso do Rio Grande do Norte, você tem um potencial extremamente relevante na fruticultura irrigada, sempre foi uma referência na produção há muitos anos, não só em termos de qualidade, mas também a diversidade de frutas, assim como aproveitando a questão do clima, de Sol. Tudo isso tem uma alta potencialidade, por exemplo, na parte de camarão. A piscicultura tem um potencial enorme já sendo explorado, mas ainda a mais para explorar.Play Video
Quais fatores você acredita que podem impulsionar esse crescimento no estado?
O Rio Grande tem características naturais climáticas de Sol, de água, de disponibilidade de correção do solo e especificamente da balança comercial do Estado. Nesses aspectos, você ainda tem uma vantagem da localização geográfica do estado, que facilita toda a questão logística para p escoamento de exportação desses produtos para os mercados europeus e americanos.
Quais os principais desafios e oportunidades existentes na pecuária de corte no RN?
Historicamente o Nordeste, mas o Rio Grande do Norte em especial sempre teve uma caraterística do valor médio da arroba para o produtor acima da média nacional. O Estado não era autosuficiente, tinha que trazer gado de fora e você tinha um custo de logística, de transportes, de impostos a pagar para colocar essa carne no mercado. Então no Rio Grande do Norte, quem conseguia trabalhar nesse mercado, conseguia trabalhar dentro de uma média nacional. O que se enxerga de potencial, de uma oportunidade é que existe uma faixa do estado com alto potencial de produção de alimentos e não há produção estruturada de agropecuária. Aí você tem uma condição de abastecer com qualidade e com um preço extremamente vantajoso para o produtor expandir esse mercado atendendo localmente a partir dessa produção, ou seja, o estado que sempre foi dependente da importação da carne passa a suprimir localmente com qualidade utilizando o potencial de algumas áreas que nunca foram exploradas de maneira que, agora que os investimentos estão sendo feitos, estão se desenvolvendo.
O que falta para potencializar esse crescimento do agronegócio potiguar?
Eu acho que muito mais a parte de expandir a capacitação dos produtores, ou seja, de colocá-los no mercado e fazer entender a dinâmica desse mercado, de atender com qualidade de produção. Você tem no Rio Grande do Norte alguns segmentos que já tem a tradição, têm a jornada em cima da qualidade de produção, mas outros que historicamente exploram de uma maneira, vamos dizer assim, menos profissionalizada. É essa capacitação dos produtores e a implantação da tecnologia adequada. A tecnologia de produção no Rio Grande do Norte não é para ser a mesma usada no Centro Sul do país, mas com a tecnologia correta e pessoas capacitadas, a gente consegue sim produzir o produto adequado para o mercado adequado, com a qualidade certa que o produtor do Rio Grande do Norte que é capaz de fazer.
Quais os principais avanços que existem hoje no melhoramento genético não apenas no Rio Grande do Norte, mas a nível regional e nacional também?
Você tem uma intensificação muito grande hoje da utilização dos chamados cruzamentos industriais, em que se utiliza uma base genética zebuína. No Nordeste tem o Guzerá, o Nelore, o Sindi, cada um com seu papel e suas vantagens, mas trabalhando o cruzamento entre raças. Com a inseminação artificial é um ganho enorme, porque permite que qualquer rebanho consiga acessar a melhor genética reprodutiva a partir do sêmem. Mais recente, alguns estados se desenvolveram na implantação de embriões para a produção do animal, tudo isso com uma série de outros programas de melhora genômica, de melhoramento genético de ultrassom e avaliação de carcaça. Ou seja, você consegue buscar no mercado bovino animais com uma gama de informações que antigamente você não conseguia acessar. Você consegue hoje buscar animais em específico para atenderem a necessidade específica de melhoramento de cada rebanho. Então é possível trabalhar características de produção de qualidade tanto de produção de carne, quanto na produção de leite.
O que isso representa em benefícios econômicos para o produtor?
No Brasil como um todo você tem ganhos, simplesmente muda a forma com que você trabalha. Em quem faz pecuária de corte ganha uma a duas arrobas a mais de peso na desmama por bezerro e isso significa aumento direto na renda das pessoas. Quando você trabalha a questão da qualidade da carcaça, você está falando de aumento o rendimento, ou seja, o boi antigamente você abatia e dava 50% de rendimento de carne e hoje em dia você trabalha com 56% a 57%. Se você subir de 50% para 55% de rendimento na carcaça de um animal, isso significa aumentar 10% n a produção de carne de um mesmo indivíduo. É ganho direto na produção e tudo isso pode ser trabalhado via genética.
Com sua experiência na raça Guzerá, como você avalia os resultados financeiros que esse gado vem trazendo para os criadores?
A pecuária como um todo passou por dois anos muito difíceis em que o preço de mercado caiu significativa e a atividade teve uma baixa rentabilidade. Nesses momentos você ter animais de raça que ganham e garante esses ganhos, seja de produção de peso, de leite ou de qualidade, fazem a diferença. Isso a gente conseguindo ganhar mercado mesmo no momento de crise, garantindo liquidez, e acho que é o principal fator. O que a gente está vivendo agora é a sinalização de mercado de uma recuperação nos preços de mercado da arroba já para 2024 e com a sinais ainda melhores para 2025. Isso se confirmando a atividade como um todo, voltamos com muita força nesses próximos dois anos.
A Guzerá é mesmo a raça de maior lucro ou existem outras com grandes potenciais de rentabilidade?
A grande vantagem da raça Guzerá é porque ela se adapta em uma maior quantidade de cenários diferentes. Eu costumo dizer que se você vai fazer um cruzamento para leite, o Guzerá é uma excelente opção, e se você vai fazer cruzamento para corte, o Guzerá também é uma excelente opção. Essa raça consegue melhorar tanto no aspecto de produção de leite, quanto ao aspecto de produção de carne em qualidade da carcaça. Talvez ela seja a grande exceção do mercado que você trabalha essas qualidades, então é uma raça muito completa e por isso é uma grande opção para praticamente todos os mercados.
Como você considera a importância da Festa do Boi para o fomento ao agronegócio potiguar?
Eu ando muito e conheço muitas exposições agropecuárias no Brasil, mas a Festa do Boi, para mim, não deve a nenhuma exposição agropecuária do país. Ela é do nível de todas as melhores. A Festa do Boi sempre foi referência na região Nordeste como um polo tanto de propagação e de multiplicação genética para a região, mas também no sentido comercial. Ela é o momento em que as pessoas conseguem se atualizar das tendências, das mudanças do mercado. Eu diria que é o grande evento da agropecuária nordestina e um dos maiores do Brasil. Nos últimos anos a Festa do Boi se fortaleceu ainda mais em relação ao que já era, se profissionalizou e se com consolida como um grande evento.
Você foi um dos palestrantes dos Motores do Desenvolvimento do RN, promovido pelo Sistema Tribuna na Festa do Boi. Como você acredita que podemos impactar diretamente esses produtores rurais?
A imprensa e a Tribuna do Norte, em especial, tem o papel extremamente importante de comunicar a sociedade e as pessoas envolvidas em colocar a questão do agro no dia a dia. É trazer mais conhecimento, informação, tanto para o consumidor, quanto para produtor. É essa troca de informações que leva todo mundo a crescer junto. No Brasil como um todo, as regiões que mais de se desenvolvem são as regiões que estão sendo puxadas pelo agronegócio. No Rio Grande nós temos um potencial enorme e seguir mesmo caminho com a informação correta é uma alavanca essencial para que isso aconteça.
Quem
Geraldo Melo Filho tem 52 anos e é filho de Geraldo Melo, ex-governador e ex-senador do Rio Grande do Norte com grande atuação no agronegócio. Formado em economia e com experiência como produtor rural, ele foi presidente nacional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) entre os anos de 2019 e 2022, e hoje ocupa a cadeira de diretor geral do Instituto Pensar Agropecuária (IPA).
Tribuna do Norte